Enquadramento do Buraco Roto - Suplemento

9 - INTERPRETAÇÃO DA CIRCULAÇÃO DE FLUXOS HÍDRICOS NO BURACO ROTO

9.1 - CONDICIONANTES FÍSICAS

Como se pode observar pelo diagrama topográfico simplificado (ligeiramente basculhado para NW), em projeção 3D (fig. Nº 19), os cerca de 1200 metros de desenvolvimento da gruta do Buraco Roto apresentam alguma diversidade de cotas entre os vários desenvolvimentos com pequenas variações de nível. As ligações sequenciais entre essas várias partes vão-se fazendo por passagens verticalizadas com o respetivo chão (zona superior) a níveis quase sempre ligeiramente mais elevados à medida que se avança para o interior da cavidade. Ao longo de toda a gruta ocorrem estreitamentos acentuados (quase sempre próximos das cotas mais baixas) que em geral apresentam a particularidade de possuírem a montante espaços amplos. Ao longo dos últimos anos observaram-se depósitos de substanciais volumes de areia em alguns pontos da cavidade e a sua posterior remobilização. São sedimentos alóctones. Estes depósitos podem ser observados em zonas particulares ao longo de todo o desenvolvimento da gruta desde os ressaltos próximos da entrada até junto da obstrução final mais baixa ainda não ultrapassada (ponta de exploração). Não nos foi ainda possível determinar, com segurança, como é efetuada a ultrapassagem, pela areia, de certas zonas com condutas mais verticalizadas. Poderão existir e serem utilizadas para outras condutas interiores que desconhecemos.

 

Ao longo de algumas dezenas de metros no leito exterior da "nascente" do Buraco Roto só se observam vestígios de depósitos de areias. A sua passagem para o exterior não deverá ser significativa. Aparentemente volumes importantes de areias são transportados, no interior da cavidade, e depositados em possíveis níveis inferiores ou eventualmente laterais não conhecidos. Nas hortas e leito da "nascente" um pouco mais à frente há alguma areia mas é proveniente da mancha Cretácica localizada na zona.

 

Um facto interessante a referir é a igualdade das cotas entre o chão da entrada, na cavidade, e, da obstrução na ponta de exploração, a este (ponto A da Fig. Nº 19 a 190m).

Figura Nº 19 - Diagrama topográfico 3D simplificado. Referenciação toponímica adotada.

9.1.1 - Zona mais interior da gruta - Na ponta de exploração de 2015 foram ultrapassados depósitos com volume apreciável que quase obstruíam a passagem descendente para a sucessão de estreitezas à cota de 190 metros. Uma nota curiosa e um bom indicador de um eventual desenvolvimento mais espaçoso, a nível mais baixo, para lá dessas passagens estreitas foi o importante retorno das areias nessa direção em face de um provável vazamento rápido para montante do volume de água acumulado até ao refeitório e parte do meandro da Virgem Traiçoeira até à cota dos 196 metros. Esta observação feita em Setembro de 2016 já foi documentada na interpretação dessa zona.

Figura Nº 20 - Observam-se na parede os testemunhos de antigos níveis de depósitos posteriormente removidos.

 

 Em cheia a força do fluxo de água vai transportando progressivamente a areia e depositando-a (quando a energia da corrente de água diminui) a jusante mesmo até cotas mais elevadas (196m) no chão do meandro como já foi referido e ilustrado quando se fez a interpretação dos resultados observados depois do poço da Virgem Traiçoeira e ao longo de todo o meandro para Este. Neste meandro e a partir de determinada altura (zona média) deixa de haver vestígios de areia. Esta passa, por entre os blocos do chão, para baixo. Na pequena galeria no interior da Cabeça do Crocodilo há sempre deposição de areia e um pequeno lago. Sobre a ou as ligações a montante dela (desconhecidas) não é possível fazer qualquer avaliação (possivelmente será a atual conduta mais importante para a passagem do fluxo ou fluxos provenientes do interior).

9.1.2 - Zona intermédia da gruta - A aparente estabilidade de um possível e pequeno nível suspenso residual na passagem da Cabeça do Crocodilo não revela a sua importancia no aporte e remoções de areias com origem (muito provável) no interior e nas zonas superiores. Este transporte poderá ter provocado acumulações em ocos intermédios podendo vir a criar importantes variações nos caminhos e orientações dos eventuais fluxos de drenagem em cada ano e nos próximos anos. Aparentemente e  durante o período de abaixamento interno dos vários níveis observa-se uma situação de interptretação controversa a jusante da passagem da Cabeça do Crocodilo. Após a bombagem  do sifão, de ligação ao exterior, em Maio de 2014 e das várias desobstruções realizadas até ao fim do verão  ultrapassou-se a Passagem do Lançamentos. Com vários locais de substanciais depósitos  de areia já ultrapassados  nada fazia prever a imagem que se nos deparou para montante. Uma ligeira rampa ascendente onde ocorreu um grande depósito de areia que foi posteriormente erodido por uma pequena escorrência criando um espetacular meandro na própria areia.

 

Figura Nº 21 - Foto da esquerda - Parte superior do depósito de areias e espaço lateral por onde se efetuou a drenagem que, mais abaixo se fez em encaixe no meandro na areia.

Foto da direita - erosão em depósito lateral a cerca de 185m. (Foto: José Ribeiro)

Ao deslumbramento estético do momento seguiu-se alguma estranheza. Como ocorreu esta evolução? Este local tem uma cota de 180 metros. Estamos um metro abaixo da Cabeça do Crocodilo a montante mas pelo meio há uma cota com 185 metros para ultrapassar. Os principais fatores favoráveis a esta evolução local são o mais rápido escoamento do nível interno a jusante do ponto mais elevado do chão da galeria até à Cabeça do Crocodilo  (185m), para montante deverá ser bastante mais lento. Um indicador favorável a uma pequena diferença do nível interior acima dessa cota é documentado pela foto da direita. Houve um ligeiro transvase por este local à cota de 185 metros devido a manutenção pontual e limitada (terraço lateral de areia) dos níveis interiores após a paragem do luxo de cheia e evolução do seu esvaziamento (2013/2014). A explicação desta variação passa assim para a evolução dos vários níveis hidrológicos a montante desta parte da cavidade. A alimentação a partir do nível interior mais elevado (198m) deixa de se fazer quando a água baixa da cota dos 196/197 metros como referimos oportunamente. Foi ainda constatado que na parte terminal da gruta o abaixamento total deste nível mais elevado por esvaziamento foi relativamente rápido até cerca dos 190 metros. Uma eventual explicação só pode ser encontrada na parte desconhecida de condutas entre a passagem da Cabeça do Crocodilo e o desenvolvimento inferior do Meandro da Virgem Traiçoeira na sua ponta ocidental. Não foi considerada uma eventual  pequena escorrência através da obstrução terminal da Galeria 2014 (facto possível mesmo com o aparecimento de uma boia nessa galeria).

 

Apresenta-se de seguida a disposição de todos os depósitos de areia com localização exacta e fotografia ilustrativa da sua dimensão (observações de 2014).

As figuras Nº 22 e Nº 23 ilustram, em planta e em perfil quer a localização dos depósitos, quer a observação da sua volumetria, quer ainda as alterações durante esse ano, posteriores à sua deposição, como a remoção parcial que criou as vagas de superfície (Foto: pontos de topografia (pt) chão 4.6-4.7), os meandros e o colapso parcial de terraços laterais (Foto: pt chão 4.9-4.10). Ilustram-se ainda dois depósitos nas imediações da passagem da Cabeça do Crocodilo (Pormenor e rampa de areias).

Figura Nº 22 - Planta parcial do levantamento topogáfico da cavidade representando a zona onde se

observou a remoção das areias (pt 4.6 a 4.11 - estações do levantamento topográfico CEAE-LPN).

 

 

Figura Nº 23 - Perfil parcial do levantamento topogáfico da cavidade representando a zona onde

se observou a remoção das areias (perfil  entre pt 4.6 e 4.11 - levantamento topográfico CEAE-LPN.

No ano seguinte e novamente após bombeamento do sifão  na Zona da Passagem da Lengalenga em 6 de Junho  de 2015 acedemos à zonas atrás ilustradas cujo aspeto passamos a documentar. Toda a areia dos meandros foi levada para jusante e a rampa entre 4.10 e 4.11 sofreu uma acentuada redução de volume.

 

  

Figura Nº 24 - Ilustração de dois dos locais onde os fluxos subterrâneos do inverno de 2014

fizeram remoção de areias (foto da esquerda - pedra ao fundo 4.7 indicada na Fig. 4.9 e

foto da direita - chão 4.10 - 4.11 na mesma figura). (Fotos: Pedro Pinto).

Nesta exploração o primeiro trabalho realizado foi a bombagem da passagem a -9m (Cabeça do Crocodilo) e a retirada de alguma areia para se aceder à galeria interior. Verificou-se ter um desenvolvimento quase horizontal com orientação para Este cujo estreitamento progressivo inviabilizou a progressão quer no possível desenvolvimento superior quer no inferior.

 

  

Figura Nº 25 - Planta e perfil da pequena galeria para o interior da passagem da Cabeça do Crocodilo. (Topografias. CEAE-LPN).

 

A passagem da Cabeça do Crocodilo é a mais notável e possivelmente a principal passagem de drenagem do nível superior para a conduta principal (Fig. Nº 26). Está profundamente trabalhada pela passagem da água apresentando ainda em alguns locais arestas serrilhadas resultantes do frequente impacto de areias por projeção cuja energia cinética é potenciada pela velocidade do fluxo da corrente. Também é notório o maior desgaste basal efetuado pelo seu transporte como importante e continuada carga de fundo.

Figura nº 26 - "Cabeça  do Crocodilo". Atual passagem ascendente da água à cota de -9 m em relação à entrada da cavidade. (Foto: André Reis).

 

No prosseguimento da exploração a 10 de Junho em níveis superiores verificou-se ao passar na "Cabeça do Crocodilo" que o nível da água estava a cota mais elevada do que na altura da bombagem (4 dias antes). No leito do alto e longo meandro que se desenvolve na direção Este na aparente continuação da pequena galeria que se segue à "Cabeça do Crocodilo" e a pouco mais de uma quinzena de metros mais acima não foram observados vestígios de água. Ela só volta a aparecer a cerca de 7 metros mais abaixo (190m) no fundo de uma fenda lateral com orientação para norte e ortogonal ao meandro referido após cerca de 130 metros de meandro (final da galeria da Virgem Traiçoeira).

Há alguma dificuldade em perceber a movimentação de areias entre a Passagem da Cabeça do Crocodilo e a Passagem do Lançamento no Inverno de 2014/2015, com a sua deslocação para o interior desta última e para a sala a jusante dos depósitos atrás documentados. Foram recolhidas várias amostras das camadas de areia (2015) num dos locais mais relevantes da cavidade neste aspeto - sala a jusante da Passagem do Lançamento. Não é possível fazer uma comparação, dessas camadas, com as observadas em 2014 na ampla galeria logo a montante dessa passagem por não haver termo de comparação (exceto por fotos de âmbito geral). Só nos próximos anos poderemos obter informação mais detalhada. Neste local, para além das dificuldades postas pela remobilização na conduta principal, poderá existir um débito ou eventualmente aporte de areias pela pequena estreiteza, não explorada a nível inferior (ponto de interrogação no pequeno mapa da foto maior na fig. Nº 27).

 

  

Figura Nº 27 - Camadas, em depósitos de 2014, localizadas na área indicada pela seta verde (pequeno recorte da topografia) completamente removidas durante o inverno desse ano. Na foto da direita, depósito na sala a seguir à Passagem do Lançamento em Outubro de 2015 no ponto indicado pela seta vermelha no pequeno recorte. As fotos têm escala semelhante. (Fotos: José Ribeiro e Pedro Pinto)

 

A pequena serie de fotografias que se segue permite uma visão um pouco mais detalhada e ilustrativa da dimensão e efeito destes depósitos nestes poucos metros de gruta.

  

Figura Nº 28 - Foto da esquerda é a saída da Passagem do Lançamento para montante.

Foto da direita é um pormenor interno após a passagem do explorador (2015). (Fotos: André Reis)

 

 

Figura nº 29 - Goteira intermédia entre a sala das areias e Passagem do lançamento (2014). (Fotos: José Ribeiro e André Reis)

 

O facto de existir esta importante alteração da posição e acumulação de areias poderá influenciar e, eventualmente, alterar os caminhos do fluxo da água. Na conduta principal esta possibilidade é remota e o local agora analisado é o mais relevante. A margem para o aumento de volume de deposição de areia na sala a jusante da Passagem do Lançamento é grande. Ao longo dos anos da nossa exploração (após desobstrução da Passagem da Lengalenga) este local de acumulação de areia tem tido sempre um ligeiro aumento de nível mas que, aparentemente, será inferior ao volume depositado em cada ano.

 

Desconhece-se qual o caminho do provável e eventual trajeto de transporte das areias para jusante da sala de acesso à Passagem da Lengalenga. No entanto também há acumulações importantes nesta parte da gruta (zona antiga) e alterações da localização dos depósitos. Ponto da topo 38?

 

Figura Nº 30 - Zona de areia apenas a poucas dezenas de metros para jusante da Passagem da Lengalenga. (Fotos: André Reis)

NOTA: - Ao longo de toda a gruta há zonas com quantidades substanciais de areia e outras sem areia independentemente das dificuldades de movimentação (desníveis importantes). Como se realiza o seu deslocamento nas zonas intermédias?

 

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